Poucas coisas me deixam mais feliz do que entrar em um território sonoro que eu não domino. Talvez por isso eu goste tanto de sair para ouvir bons DJs. Isso para dizer que hoje eu quero compartilhar um mix que instigou bastante meus ouvidos. A compositora contemporânea e virtuose do synth Miaux, que lançou neste ano o excelente Never Coming Back, fez uma mixtape para a revista inglesa The Wire, que evoca as viagens que ela fazia quando criança da Antuérpia — onde foi morar por conta da guerra — para Sarajevo, depois do fim do conflito na Bósnia. Aperte o play e boa viagem. A foto é de Frida Royers.
Discos
No Reino dos Afetos 2, Bruno Berle (Coala Records)
Gostei do novo disco do Bruno Berle, gosto de como ele canta, gosto do jeito que toca, gosto muito das parcerias com o Batata Boy, porém tem algo nesse novo trabalho que fica um pouco abaixo do excelente disco de estreia. Talvez seja a estrutura de gravação mesmo. O primeiro tinha o charme de uma certa tosqueira digital na produção, que dava uma textura muito interessante para as canções. Aqui, tudo está mais limpo, talvez claro demais. Veja bem, eu acho que tem boas canções nesse disco, mas falta algo mais inspirador nessa nova leva de músicas, inclusive a repetição do título diz um pouco sobre isso.
The Nightmare Continues, Merzboom (Brava)
Desde que eu vi o Jhones Silva, ou God Pussy, tocando com o Tantão numa edição do Novas Frequências, eu pirei na sua maneira de erguer um paredão de ruídos sem dó nem piedade. Merzboom, seu duo com veterano do barulho Fabio A chega ao oitavo lançamento, desta vez com a colaboração de outro devoto do harsh noise, o artista visual italiano Nicola Vinciguerra, co-fundador do selo Turgid Animal. Não precisa nem falar que Masami Akita e seu Merzbow é uma influência, né?
Opus, Riuychi Sakamoto (Milan Records/Sony Music Entertainment)
Semanas antes de perder a batalha para o câncer, no ano passado, Riuychi Sakamoto foi gravado ao piano por seu filho. O resultado dessa sessão em que interpreta suas composições mais emblemáticas é o maravilhoso filme Opus, lançado no ano passado. Agora vem o disco com 20 gravações íntimas de um dos mestres da música climática.
I LAY DOWN MY LIFE FOR YOU, JPEGMAFIA (PEGGY/AWAL)
Neste novo álbum do rapper e produtor norte-americano, um dos maiores gênios dos samples, a produção é o que fala mais alto. Dá até para dizer que está menos aventureira do que nos lançamentos anteriores, mesmo assim ainda tem muitos momentos incríveis. Primeiro pelo uso do rock'n’roll já desde a primeira faixa. O disco começa com um vocal quase punk sobre um combo de guitarra e bateria metaleiros. O rock volta ao longo do disco, que, obviamente é cheio de pérolas do rap e do R&B. Rola até um “Brazil, zil, zil. E tem participações de Vince Staples, Denzel Curry e do brasileiro DJ Ramemes.
Livros
Poemas em Coletânea, Jon Fosse (Círculo de Poemas)
Depois de ter os romances lançados em português, agora é a vez de o vencedor do Nobel de literatura ver sua produção poética chegando às livrarias em português, na tradução de Leonardo Pinto Silva, mesmo tradutor dos livros de prosa. Com poemas escritos entre 1986 e 2016, essa coletânea habita o encontro entre os mundos exterior e interior.
Austral, Carlos Fonseca (Instante)
Neste romance, o escritor costa-riquenho fala de um professor universitário que deixou a Costa Rica para ir morar nos Estados Unidos e recebe a incumbência de editar um romance póstumo de uma ex-namorada que não via havia mais de 30 anos. A partir aí, ele se lança em uma investigação sobre o apagamento da cultura indígena na América Latina.
Filmes
Às Vezes Quero Sumir, Rachel Lambert (Mubi)
Esse foi um daqueles filmes que eu terminei de ver com vontade de recomeçar. Ainda não sei se realmente gostei muito dele, embora tenha ficado fascinado pela personagem principal, uma mulher extremamente tímida, oprimida na vida do escritório e que, como fuga, se deixa levar por delírios surrealistas.
The Ministry of Ungentlemanly Warfare, Guy Ritchie (Prime Video)
O filme é baseado na história real de um grupo de elite que opera à sombra do governo inglês durante a Segunda Guerra e tem como missão sabotar um navio nazista que abastece toda a frota de submarinos alemães que dominam o Atlântico. Filme de ação bem ao estilo de tintas carregadas de Guy Ritchie.
Séries
Kleo (Netflix)
Do nazismo a gente pula uns anos para o auge da Guerra Fria nessa segunda temporada dessa série alemã. O que eu gosto aqui é a mistura entre suspense e comédia, e da personagem principal, uma espiã da Alemanha Oriental que é traída e tem de seguir solo sendo sabotada por todos os lados.
Um Beijo do Gordo (Globoplay)
Jô Soares fez muito parte da minha vida. Foi meu comediante preferido quando eu era criança, lembro de ir assistir a seu programa de entrevistas no SBT quando estava na adolescência, de curtir seus textos na Veja e, depois, de me divertir com seus livros. Essa série documental em quatro episódios curtos me fez matar a saudade dessa figura gigante da TV brasileira.
Podcast
Resumido
Há anos eu sou fã do Bruno Natal, que conheci quando ele fez um filme sobre dub e eu trabalhava no Folhateen, lá se vão mais de 20 anos. Eu costumo falar de podcasts de cultura aqui, mas eu tenho uma visão de que hoje tecnologia e cultura se encontram em muitos pontos, e o jeito como o Bruno fala de tecnologia no Resumido é um pouco jornalismo arte.
A Ladrilho Hidráulico agora é feita também pela Maria Clara Strambi
Que maravilha essa mixtape (e a história por trás da seleção) da Miaux, que eu não conhecia. Obrigado!
Que edição lindinha!
Eu sou a preguiça personificado pra ouvir novas músicas, e fiquei com vontade (que, espero, torne-se ação).
Também gostei e me emocionei muito com a série sobre o Jô, apesar de achar bem chapa branca. Enfim, me levou de volta a outros tempos.