Ano passado, minha sócia Helana Bagnoli e eu fizemos um projeto incrível no Sesc com a peça Amazonias - Ver A Mata que te Vê. Além de coordenar a comunicação desse espetáculo singular, fizemos um documentário e um livro sobre a peça e as questões amazônicas, com textos incríveis. Amazonias era um dos dois projetos do ano, instigados pelo Danilo Santos de Miranda, o maior gestor cultural, no sentido mais amplo possível, que tive a sorte de conhecer. Ao lado do Amazonias, estava esse projeto para discutir a perspectiva negra no Brasil, dirigido por Marcio Meirelles e Rafael Grilo, e com uma trilha sensacional do João Milet Meirelles, filho do Marcio, mas mais do que isso, o homem dos beats do BaianaSystem e do Taxidermia, dois dos projetos mais legais de hoje. Bom, agora a peça, que parte da Conjuração Baiana de 1798, também chamada de Revolta dos Búzios, está disponível em vídeo. Recomendo muito.
Discos
GORZ, GORZ (Numeral)
GORZ é um duo formado pela argentina Lara Alarcón e pelo suíço Cyrill Ferrari. Eles se conheceram em Berlin, onde moram, e montaram esse duo a partir das canções de Lara e do instrumental de Cyrill. Os dois estiveram na última edição do Música Estranha — sou um dos curadores do festival — e agora lançam seu disco de estreia. Eles falam que o que fazem é cutecore. Acho uma boa definição para esse com anguloso, cheio de letras boas e guitarras nada óbvias, e que mescla dissonâncias com melodias pop.
Vol. 3, Acid Mothers Reynolds (VHF)
Acid Mothers Temple, uma das minhas bandas japonesas preferidas, que vem ao Brasil no fim do ano, a convite do reverendo Fabio Massari, se juntou com os argentinos do Reynolds para uma série de lançamentos. Este Vol. 3 traz quatro longas faixas em que as duas bandas "compuseram" juntas em 2017. O legal é que, embora carregue a assinatura das duas bandas, o som dessa fusão da psicodelia pesada dos japoneses com a potência torta do rock dos argentinos se mostra algo único. Imperdível para quem curte diálogos roqueiros mais abstratos.
Tránsitos Sónicos - Música eletrónica y para cinta de compositores peruanos (1964-1984) (Buh Records)
Já que eu enveredei para a América Latina, resolvi trazer essa coletânea incrível do selo mais bacana do Peru. O título entrega tudo, é uma compilação de sons feitos por compositores eletrônicos peruanos, e traz desde os primeiros experimentos com sintetizadores e música de fita feito pelos nossos vizinhos do pacífico, indo de pioneiros como César Bolaños e Enrique Pinilla, até uma segunda geração, marcada por trabalhos de Arturo Ruiz del Pozo e Corina Bartra.
Unrecognizable, Lolina (Relaxin Records)
Esse é um disco que dialoga com uma história distópica de uma cidade em que os edifícios são usados como armas numa luta entre o governo e as pessoas. Tudo saído da cabeça de Lolina, um dos nomes usados por Alina Strova, uma compositora experimental que vive em Londres. Aqui, ela não só cria a história, como a conta em duas vozes, uma feminina, cheia de efeitos, e outra com uma afinação que a deixa masculina. Embora toda a construção seja mais eletrônica, tem momentos em que soa quase como o rap experimental de bandas como Clouddead, que eu amo. Um disco curioso, que traz ainda uns vídeos enigmáticos, como o de Paris Hell Rising e Easy Rider Geneva Heat.
Livros
Odisseia Vácuo, Renato Negrão (SQN Biblioteca)
Um livro-poema que se apresenta como enigma numa experimentação livre e instigante das formas literárias. As interpretações possíveis são muitas e nos afastam das referências cartesianas. As publicações dessa jovem editora mineira, que foca na confluência entre livros-objeto, escrita experimental e cultura urbana são belíssimas. Vale a pena se inteirar. (Maria Clara Strambi)
Quadril & Queda, Bianca Gonçalves (Circulo de Poemas)
Amo os plaquetes do Círculo de Poemas, em seu lançamento mais recente, traz o terceiro livro da jovem poeta. É um livro sobre corpos, movimento, dança. Sobre liberdade e denúncia, tendo o baile como a grande metáfora da vida.
Filmes
Rewind & Play, Alain Gomis (Mubi)
O ano é 1969, Thelonius Monk está na França encerrando sua turnê europeia e dá uma entrevista ao pianista Henri Renaud. A partir de novas imagens e de trechos da entrevista, é um filme que mostra o gênio de Monk e o tamanho da incompreensão com a sua música.
The Holdovers, Alexander Payne (Prime Video)
Comédia é o gênero que acho mais difícil de todos, mas quando é bom, não tem pra ninguém. Aqui o diretor volta à parceria com Paul Giamatti que começa no excelente Sideways. Giamatti é um professor de história de uma pequena cidade em Massachusetts, responsável por cuidar de um grupo de adolescentes meio que esquecido pelos pais nas breves férias de final de ano.
Séries
Debaixo da Ponte, A Verdadeira História do Assassinato de Reena Virk (Disney+)
Essa minissérie em 8 episódios traz uma história real a partir do livro Under the Bridge, de Rebeca Godfrey. Ela narra o assassinato da jovem canadense por sete adolescentes de sua escola em 1997. Aqui não só interessa o caminho para desvendar esse crime como um olhar agudo para a crueldade adolescente.
O Regime (Max)
O Max é meio um saco de gatos, mas as produções da HBO seguem maravilhosas. O Regime é uma minissérie em seis episódios estrelada por uma Kate Winslet brilhante na pele de Elena Vernham, uma líder autoritária de um país fictício da Europa central, que começa a ver seu poder ditatorial desafiado.
Podcast
Blank Check
Sabe aquele diretor que fez algum sucesso na estreia e recebe um cheque em branco do estúdio para fazer um novo filme? Bom, esse podcast hilariante apresentado por Griffin Newman e David Sims olha justamente para esses casos, ao rever a filmografia de diretores que acabam tropeçando com seus projetos do coração.
A Ladrilho Hidráulico agora é feita também pela Maria Clara Strambi