Confesso que é difícil me tirar de casa para ir a um festivalzão hoje em dia. Nem sempre foi assim, quando eu era alegre e jovem, me jogar por dias numa sequência de shows legais era das coisas que mais me deixavam feliz. Isso para dizer a você que é novo ou animado — e sobretudo rico,— que essa é semana do Lollapalooza, com shows na sexta no sábado e no domingo. Nem preciso falar dos headliners, né? Se fosse um showzinho pequeno, adoraria ver Rosalía (foto), Tame Impala, Billie Eilish, Drake... Mas no fundo eu sou essa pessoa que gosta mais dos shows menos badalados. Nessa edição, por exemplo, meu preferido dos gringos é o Modest Mouse. Agora, para gente como eu, o mais legal mesmo são os shows paralelos. E hoje tem Jane's Addiction na Audio, que na segunda traz o Cigarrettes After Sex e, na terça, a Tove Lo. E hoje também rola Yugblud no Cine Joia. Se jogue.
Para sair de casa
No sábado, na Choque Cultural, tem a abertura da exposição Locus, individual do artista cearense Narcélio Grud com esculturas interativas e sonoras. Já na Galeria Luisa Strina abre também no dia 25 a individual Vulneravelmente Humano, de Clarissa Tossin.
E a Galeria Marília Razuk participa do projeto internacional Condo 2023. Em parceria com a galeria argentina Herlitzka & Co., abre no sábado a exposição Conceitos e Simbolismo Abstratos na Arte Argentina Hoje: Alicia Herrero, Karina Peisajovich e Candelaria Traverso.
E sábado é o último dia para ver o jogo gráfico de Coleção de Eus, de Katia Maciel, com suas intersecções entre poesia e instalação, na Zipper Galeria.
Para quem é de teatro, tem a beleza poética de Coro dos Amantes, do português Tiago Rodrigues, diretor do Festival D’Avignon no Sesc Pinheiros.
Hoje estreia no Itaú Cultural o monólogo Dolores, minha composição, concebida e interpretada por Rosana Maris, que vive a esplêndida compositora que rompeu todos os preconceitos da época. Estando por lá, vale ver a Ocupação Dona Onete, outra mulher incrível.
Num pique teatro experimental, domingo tem Edifício, com texto e direção de Lucas Mayor e Marcos Gomes no Espaço Garganta.
Hoje e amanhã no Centro da Terra, com Dellas21, duo de dança contemporânea idealizado pelas artistas Daniela Moraes e Layla Bucaretchi
Indo para a música clássica de amanhã até primeiro de abril, o Municipal apresenta a ópera de Mozart Così Fan Tutte, com direção musical de Roberto Minczuk e direção cênica de Julianna Santos.
Já na Sala São Paulo, de hoje a sábado a Osesp se apresenta sob a regência de Marc Albrecht e os irmãos Jussen ao piano. No programa, Satie, Poulenc e Stravinsky.
No domingo o pianista Hercules Gomes apresenta um repertório de Ernesto Nazareth no IMS.
No Bananal abre amanhã a exposição Corredeira, do capixaba Luis Filipe Porto, com pinturas, objetos, video, áudio e desenhos feitos ao longo dos últimos três anos. Fica até 23 de abril.
Num pique só sucessos rola Mart'nália no Blue Note e Romulo Fróes solo na Casa de Francisca. Por lá na sexta e sábado tem a fabulosa Nina Becker com seu Love, Love, Love e Metá Metá na terça e na quarta.
No Porta amanhã tem a estreia de Madrugada, a nova banda de Paula Rebellato do Rakta. Já numa sexta mais queer, tem Filipe Catto e Jup do Bairro na Casa Rockambole. E como ninguém pode parar os Autoramas, sexta tem show comemorando os 25 anos de carreira da banda na Associação Cultural Cecília.
Na quarta tem a francesa Clea Vincent + Siso no Bar Alto.
E no mondo Sesc tem: Lixomania convida Clemente, Ariel Invasor e João RDP hoje no Pompéia. Amanhã tem Jards Macalé 72, no Pinheiros, Chico Chico no Pompéia. Sábado você ter ter de escolher entre ver o Paulo Santos ou o Arrigo Barnabé no Belenzinho. E domingo tem Douglas Germano com Batuqueiros e sua Gente no Pinheiros.
Vão ter duas edições do Pista Quente no Central 1926, hoje na abertura do Futuro Mercado e domingo, no encerramento.
No sábado de tarde, a boa dançar na Lote com o dinamarquês Batukizer, Giu Nunez e Forró Red Light. A entrada é gratuita. E no domingo, KL Jay e Vivian Marques discotecam de tarde no Miúda.
Discos
Pena ao Mar, Carla Boregas (iDEAL 230)
Bom, eu sou desses que viaja longe com os projetos da Carla Boregas, seja o Rakta, seu duo com Maurício Takara ou o Fronte Violeta. Esse é seu primeiro disco solo, feito a partir de uma residência artística em 2020. Carla se aventura por uma série de instrumentos dos synths analógicos ao Wurlizer até gravações de campo e cactos processado (é isso mesmo). O que interessa é como ela compõe as dinâmicas, como navega por texturas. Um disco tanto entrar em estado meditativo quanto para deixar a mente aguçada.
EICNSSCS, Maurício Tagliari (YB Music)
O subtitulo do disco entrega um pouco da brincadeira aqui: experiência de improvisação coletiva não sincrônica cumulativa sequencial. Trocando em miúdos: durante a pandemia, Maurício gravou seu violão e passou essas faixas para outros cinco músicos improvisarem sobre as cordas. Eram Luca Raele (clarinete), Christiano Lemgruber (bateria), Regis Damasceno (eletrônicos), André Édipo (eletrônicos) e Missionário José (eletrônicos). Uma coisa interessante para quem é fã de improvisação livre como eu é que, embora a sobreposição das camadas musicais crie uma atmosfera de surpresa, um dos efeitos colaterais do improv ao vivo, aqueles momentos em que os músicos tateiam ideais sem muito sucesso, são bastante reduzidos aqui. As oito faixas que resultaram do experimento são, com certeza, desafiadoras, mas muito ajustadas.
Blazing/Freezing, Astroturf Noise (577 Records)
Bom, hoje eu resolvi não aliviar muito na seleção, mas essa banda vale. O lance do Astroturf Noise é juntar improvisação livre com música de raiz norte-americana, tudo ainda mais zoado por efeitos e ruídos, tipo uma casamento improvável entre bluegrass e no-wave. Mas o louco é que fica bom, isso pra quem gosta de desafios e de criar sentidos colando os caquinhos.
Praise a Lord who chews But Which Does Not Consume; (Or Simply, Hot Between Worlds), Yves Tumor (Warp Records)
Nessa semana eu estava batendo um papo com o meu filho sobre como a Warp já não é mais a mesma do auge do Autechre e do Aphex Twin, e aí eu ouço esse disco que confirma e ao mesmo tempo relativiza a nossa tese. Que bom que os tempos mudaram. A Warp está mais pop, com certeza, mas como o trabalho mais recente do Yves Tumor, é um pop cheio de marra, todo retorcido. Aqui a gente tem essa mistura de som anguloso do pós-punk com uma produção eletrônica, que às vezes é mais conformista, mas no geral consegue criar uma espécie de útero para as canções, que nascem meio a fórceps. E isso é legal.
Livros
Terra Arrasada, Jonathan Crary (Ubu)
O subtítulo do livro é “Além da Era Digital. Rumo a Um Mundo Pós-Capitalista". Trata-se de uma segunda parte da crítica contundente que Carry faz ao atual estágio do capitalismo hiperconectado de seu livro anterior, 24/7. Mas a tese de Carry aqui, um tanto ludita, é de que o mundo digital não é algo irreversível e, como bom marxista, se a gente quiser evoluir para uma sociedade de valores comunais, precisa implodir o capitalismo, internet e tudo mais. Não concordo com a tese, mas acho interessante que exista alguém pra defendê-la.
Cuspa Três Vezes, Davide Reviati (Veneta)
A história parte de três personagens jovens, Guido, Moreno e Katango , vivendo na zona rural e passando seu tempo na dissipação do fim da adolescência. Suas vidas mudam a partir do encontro com uma garota cigana, Loretta. De um jeito poético, fala da dor do choque desses mundos, sem minimizar a perseguição ao povo cigano.
Filmes
Fabian - O Mundo Está Acabando, Dominik Graf (Mubi)
Essa não é a melhor semana para estreias no cinema. Então eu vou de streaming, começandopor esse filme alemão de 2021, que se passa em um dos períodos mais interessantes da história alemã, o fim da república de Weimar, pouco antes do nazismo. É uma história de amor entre um publicitário e uma atriz que, sem dar spoiler, se equilibra num fio entre a boemia e a catástrofe.
A Livraria, Isabel Coixet (Netflix)
Esse filme não é novo, mas assistir recentemente e é sempre bom ter um filme legal na manga quando se trata de Netflix. Gostei da delicadeza da história dessa viúva que luta para abrir uma livraria numa cidadezinha costeira da Inglaterra no fim dos anos 1950 e tem de se defrontar com a resistência da elite local.
Séries
Chef Alex Contra Todos (Discovery +)
Quando não quero pensar muito, como foi o caso nesta semana, nada me acalma mais do que reality show de culinária. Cada um tem o guilty plaesure que merece. Um dos recentes mais legais é esse em que a Ironchef Alex Guarnaschelli, fantástica, enfrenta sempre três competidores especialistas em um tipo de culinária. Não cheguei no final, mas essa segunda temporada está muito boa.
O Agente Noturno (Netflix)
Bom, para terminar a semana, outra série pipoca: desta vez de ação, sobre um agente que fica de plantão esperando que nada acontece, só que, claro, algo acontece, senão não teria série. Bom pra quem já deu plantão em jornal no sábado de noite.