Tudo começa depois do rescaldo do Carnaval. Mas uma coisa que eu queria destacar aqui antes de tudo é a vinda de mais um espetáculo da Cia Dos à Deux, Enquanto Você Voava, Eu Criava Raízes (foto de Renato Mangolin). Radicada na França, a dupla formada por André Curti e Artur Luanda Ribeiro faz uma performance que bebe do teatro e da dança mas não pode ser classificado dentro de uma só caixinha. O importante é que, em todas as vezes que vi um espetáculo deles, a experiência sempre foi boa demais. Este novo trabalho, que fica em cartaz no Sesc Santo Amaro só até 2 de abril, é mais um convite para mergulhar nesse universo sensorial em que o corpo e os visuais dizem mais do que muitas palavras. Eu não vou perder.
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Para sair de casa
Abre no sábado a Pinacoteca Contemporânea, novo espaço a integrar a família da Pina na avenida Tiradentes. E até abril a entrada será gratuita. As duas exposições que inauguram o novo espaço são Chão da Praça, que reúne 60 obras de grandes proporções do acervo da Pinacoteca, e a outra é Haegue Yang: Quase Colonial, que olha para o trabalho conceitual da sul-coreana, que passa por esculturas, instalações, obras em papel, fotografia, vídeo e escrita.
Começa hoje com O Pagador de Promessas, de Anselmo Duarte, a mostra gratuita O Brasil no Oscar, na Cinemateca Brasileira. Nesta semana ainda passam o curta Um História de Futebol, de Paulo Machline e Tony Gil, e o longa Raoni, de Jean-Pierre Dutilleux e Luiz Carlos Saldanha, amanhã, Orfeu Negro, de Marcel Camus, no sábado e Lixo Extraordinário, de Lucy Walker, no domingo.
Para quem curte clipes, amanhã no MIS rola a Mostra de Videoclipes Couple of Things, com um bate papo com os autores dos filmes, o casal Diana Boccara e Leo Longo.
Fica só até 26 de março do Teatro Faap a peça Frições, em que Vera Holtz se desdobra em vários personagens a partir do livro Sapiens, de Yuval Noah Harari.
No sábado de tarde rola a festa Compacto com Marky e Elohim discotecando funk, soul, disco e boogie na Balsa. Concorrendo, tem Pista Quente no Lote.SP. Mais tarde finalmente acontece a primeira Mamba Negra do ano em São Paulo.
O show mais importante desta semana é sem dúvida o MOTYRÕ na Casa Natura Musical que acontece na próxima terça e terá a renda revertida para a população afetada pelas chuvas no litoral norte. São mais de 30 artistas, entre eles Anelis Assumpção, Arnaldo Antunes, Céu, Chico Cesar, Catatau, Thalma de Freitas, Tulipa Ruiz, Siba, Kiko Dinucci, Juçara Marçal. Deu pra sentir, né?
Mas a programação de lá na semana está bem boa: hoje o DJ Nyak convida Melle e Xenia França, na sexta e no sábado tem Letrux e no domingo Badi Assadi convida a Orquestra Mundana Refugi.
Outra programação boa nesta semana é a da Casa de Francisca, com Cida Moreira, Ivan Gomes e Lê Coelho fazendo as canções de Sérgio Sampaio hoje, Ná Ozzetti com Dante Ozzetti e Mario Manga na sexta e no sábado, e Mestrinho na terça e na quarta.
Ainda no rolê das casas, hoje tem Preta Batuque na Casa Barbosa. E seguindo no batuque preto, sábado e domingo tem Lecy Brandão no Itaú Cultural.
No Mundo Pensante hoje é dia de Di Melo, depois a tradicional noite do DJ Nuts. E, amanhã, rola o Baile da Samucagem.
Já num role mais experimental, hoje eu não perderia o Marques Rodrigues Duo + Inés Terra na Bananal.
Vamos lá para o mundo Sesc. Hoje a Anna Vis apresenta seu disco de estreia no Vila Mariana. Já a maravilhosa Teresa Cristina leva seu Um Sorriso Negro para o Sesc Pompeia de hoje a sábado. Na sexta e no sábado tem o lemonhead Evan Dando intimista só com voz e violão, no Avenida Paulista. Num pique clássicos, de sexta a domingo tem Edu Lobo comemorando seus 80 anos no Belenzinho e Elba Ramalho no Vila Mariana. Já no Pinheiros, também de sexta a domingo, Anelis Assumpção mostra o disco Sal, um dos meus favoritos do ano passado. No fim de semana, mestres da tradição como Guinga e Proveta fazem tributo a Luiz Bonfá no Santana.
E essa é a semana que o mundo clássico volta com tudo. De hoje a sábado tem a abertura da temporada de 2023 da Osesp na Sala São Paulo, com a Sinfonia 3ª em Ré Menor, de Mahler. E vai ter guerra de Mahler. No sábado e no domingo, a Orquestra Sinfônica Municipal apresenta a 6ª de Mahler e a 2ª de Prokofiev. A temporada do São Pedro começa semana que vem, mas para os fãs radicais de ópera, na terça dá pra ver o ensaio geral da nova montagem de Dido e Eneas, de Purcell, de graça.
Discos
Na Goela, Romulo Fróes e Tiago Rosas (YB Music)
O encontro dos compositores traz uma amálgama interessante, com cada um recrutando seus escudeiros para a banda. No canto do Romulo estão Guilherme Held na guitarra e Marcelo Cabral no baixo, synth e guitarra. Já no canto do Tiago, o baterista Lucas Fixel. Acompanho a carreira do Romulo desde Calado, lá no começo dos anos 2000, e gosto justamente de como ele consegue trazer sempre uma sonoridade diferente a cada álbum. Mas neste ele finalmente chegou no rótulo que imprimiam em suas composições no começo de carreira: indie samba. Na Goela tem as guitarras mais indies que se vai ouvir junto com a voz de Romulo, que finalmente parece ter colocado de lado o Nelson Cavaquinho para chegar perto do som de Johnny Marr e do Setphen Malkmus. Curioso.
Como Um Bicho Vê, Anna Vis (YB Music)
Quase que dava para fazer esta edição só com os lançamentos novos da YB, mas vou guardar um excelente pra semana que vem. Com direção do Romulo Fróes, esse disco de estreia da Anna Vis era daqueles que eu estava esperando, depois de vê-la ao vivo algumas vezes. E é melhor do que eu imaginava. Gosto muito da incorporação do poesia mesclada com as paisagens sonoras do Mbé ao longo do álbum, e, claro, das composições, que são urbanas e falam de hoje de uma perspectiva nada óbvia, intrigante. E escolher a sessão rítmica com Marcelo Cabral (baixo e synths) e Maurício Takara (bateria) é um baita acerto para dialogar com a voz e o violão de Anna nessas canções cheias de inquietação.
Sometimes the Air Is, Steve Swell, Joe McPhee, Chris Corsano (Mahakala Music)
A onda desse selo é criar encontros únicos, e esse é um deles, reunindo pela primeira vez Swell no trombone, McPhee no sax tenor e Chris Corsano na bateria, em, claro, improvisações livres. Lendas do free jazz, Swell e McPhee já haviam gravado juntos no começo dos anos 2000, e o duo de McPhee com Corsano, baterista que é uns 30 anos mais novo, é desses encontros antológicos com vários registros. Mas os três nunca haviam gravado juntos e essa sessão de um dia mostra como um instiga a imaginação do outro a criar espaços cheios de ar em convulsão.
Girl in the Half Pearl, Liv.e (In Real Life Records)
Se tem uma coisa que faz esse disco se destacar de outras produções contemporâneas de R&B é que, em vez de se inclinar para a vertente mais óbvia do pop, sua sonoridade vem de não ter medo de dissonâncias e experimentações. Mescla beats desafiadores a samples jazzísticos e justapõe todas as fontes à voz extremamente melodiosa da cantora de Los Angeles, aqui gravada de um jeito lo-fi, que não apenas dá um outro peso para as canções como nos livra de mais um disco cheio brilho e efeitos nas vozes. Um som que faz ecoar as letras que descortinam uma jovem mulher, às vezes sombria ao lidar com as dores de estar no mundo, mas que também sabe que aqui e ali, entre os escuros, há maravilhas.
Livros
São Sebastião das Três Orelhas, Fabrício Caorsaletti (Circulo de Poemas)
Depois do delicioso livros de sonetos de Bob Dylan na Argentina, o poeta brasileiro vai para o bairro de Gonçalves, na serra mineira, para construir seus poemas a partir da vivência nas montanhas. Inaugura a coleção em que os escritores são convidados a escolher um mapa de um lugar: real, inventado, desejado.
O Papa do Suingue, Kamille Viola, (Edições Sesc)
Lançado como e-book na pandemia, o livro ganha edição impressa. Neste volume da coleção Discos da Música Brasileira, idealizada pelo Lauro Lisboa Garcia, Kamille Viola se debruça sobre o seminal África Brasil, de Jorge Ben Jor, em que não só a guitarra entra em primeiro plano no lugar do violão como há todo um diálogo com os polirrítmos africanos.
Filmes
Close, Lukas Dhont (cinemas)
Indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, o vencedor do Grande Prêmio de Cannes do ano passado chega aos cinemas depois de ter sido exibido na última Mostra. O filme do diretor belga trata da amizade de dois garotos pequenos que é interrompida subitamente por um deles. Um filme sensível, que discute homofobia e masculinidade tóxica.
Pink Moon, Floor van der Meulen (Filme Filme)
O primeiro longa de ficção da jovem diretora holandesa parte do anúncio que o pai, prestes a completar 75 anos, faz a seus dois filhos: ele não irá completar 76 anos e já está com tudo acertado para deixar a vida de uma maneira bem pragmática. O filme é centrado na personagem da filha e em como ela trabalha para digerir essa bomba familiar. É também um dos novos longas que estão na plataforma de filmes que voltou reformulada.
Séries
O Consultor (Prime Video)
Esta nova série de suspense do Prime, protagonizada pelo premiado ator austríaco Christoph Waltz, começa com o suicídio do presidente de uma empresa de games. Um consultor chega para fazer a investigação e também para organizar a companhia de um jeito um tanto radical. Mas aí começam as suspeitas sobre a sua identidade e seus reais propósitos.
Dois Verões (Netflix)
Dica sensacional da minha cunhada Celina, essa minissérie belga acompanha um grupo de amigos em dois verões, um nos anos 1990 e outro agora quando estão todos próximos dos 50 anos. Uma tragédia no primeiro verão e uma chantagem no segundo fazem com que o reencontro não seja exatamente a festa planejada.
Um podcast
Ontem, Carolina Andrade, que foi mulher do Marcus Pereira, nos deixou. Para quem não sabe, a Discos Marcus Pereira foi uma das gravadoras independentes mais importantes de música Brasileira. Suas gravações de Cartola, por exemplo, são antológicas. E descobri que Carolina foi a principal entrevistada nesse podcast de quatro episódios que conta a história desse que é, na minha opinião, um dos selos mais importantes da história da música brasileira. Como não é muito fácil de achar, deixo aqui o link para os 4 episódios de Discos Marcus Pereira: o Mapa Musical do Brasil, apresentado por Felipe Misale na Cultura: episódio 1, episódio 2, episódio 3 e episódio 4.