Nossas joias são bem mais valiosas do que aquelas que as figuras abjetas do passado tentaram tungar. Na verdade nossas joias são intungáveis, à prova de zumbis de filme B arrastando seus corpos com bolor verde e amarelo pelo noticiário político.
Quero começar essa semana com uma joia de muitos quilates e muitas camadas: um híbrido entre arte e dança em cartaz no Instituto Tomie Ohtake até o domingo, a performance Horizonte, criada por Eduardo Fukushima e Bia Sano, desenha um diálogo entre os corpos em movimento e as obras de Tomie Ohtake. A performance faz parte do Tomie Dançante, que vai até o próximo fim de semana com um último espetáculo, desta vez uma coreografia de Davi Pontes dançada por Sebastião Abreu, no dia 18. Essa colagem de fotos foi feita a partir de imagens gentilmente surrupiadas do curador Paulo Myada.
Parafraseando meu amigo China, vamos às outras joias da semana, minha joia.
Para sair de casa
Seguindo os passos da dança, hoje e amanhã tem Ester Lopes com Murta- As Mulheres que Habitam em Mim no Centro da Terra.
Indo para o teatro, volta aos palcos do Oficina O Bailado do Deus Morto, espetáculo inspirado na obra de Flavio de Carvalho, de sexta a domingo, até o dia 26 de março.
E de sexta até este próximo domingo tem Oeste Verdadeiro, de Sam Shepard, com direção de Mário Bortolotto, no Cemitério de Automóveis.
Hoje é a estreia da temporada lírica do Theatro São Pedro, com a montagem da ópera Dido e Eneas, de Henry Purcell, com regência de Luis Otavio Santos e direção cênica de William Pereira. Já no elenco, a soprano argentina María Cristina Kiehr (Dido/Elissa), Marilia Vargas (Belinda), Johnny França (Eneas/Phoebus), Homero Velho (Feiticeira/Spring), Daiane Scales (Primeira bruxa), Ludmila Thompson (Segunda bruxa e Segunda mulher) e Jabez Lima (Marinheiro/Spirit).
Abre hoje no Morumbi Shopping a exposição imersiva Imagine Piscasso, que brinca de cubismo digital com as obras do mestre modernista espanhol.
Duas exposições incríveis estão no Galpão da Fortes D'Aloia & Gabriel: Recipe for Disaster, com obras inéditas do baiano Antonio Tarsis, e a primeira exposição no Brasil do pintor Frank Walter, que traz sua leitura abstrata da diáspora afro-caribenha.
Já na Nara Roesler, vale uma visita à individual de Vik Muniz, Dinheiro Vivo.
E, fechando o ciclo de artes dessa semana, eu não perderia a exposição Arte Cinética: passado e presente, que abre hoje e fica até 6 de maio na Galeria Raquel Arnaud, com curadoria da própria galerista.
Hoje tem Tatá Aeroplano no Picles, Bem Gil e Moreno Veloso no Blue Note e Kiko Dinucci e Juçara Marçal, fazendo dois shows em um: Rastilho e Delta Estácio Blues, na Casa Natura Musical, que traz ainda o fenômeno Marina Sena na sexta e no sábado e o incrível Bloco Ilu Obá De Min no domingo.
Amanhã, no Bananal Arte, tem a segunda edição da Rotunda, que promove a interação entre artistas visuais e sonoros, entre eles G.Paim com Carol Costa e Raquel Krüger com VJ Não Consta.
No sábado, Romulo Fróes e Tiago Rosas lançam Na Goela no Centro Cultural São Paulo. Já na Audio tem Favela Vive com Marechal e ADL.
Domingo, de graça, tem Mercado Porta, comemorando um ano desse cantinho incrível. Outro bom programa domingo é o Festival Feminine Hi-Fi, com seis horas de som e muitos ecos da Jamaica, no Tendal da Lapa.
Para os amantes da segunda sem lei, tem Facada, Test e D.E.R na Associação Cultural Cecília.
Já no Centro da Terra no mesmo dia, Ná Ozzetti dá sequência à temporada deste mês. E na terça tem Bufo Borealis com Edgard Scandurra.
Na Casa de Francisca, o melhor desta semana está concentrado na terça e na quarta, com o lançamento na terça do segundo volume dos Sambas do Absurdo, com Rodrigo Campos, Gui Amabis e Juçara Marçal, e o show da Orquestra Brasileira de Música Jamaicana no dia seguinte.
Para iniciar um giro pelo Sesc, é preciso falar da programação incrível do Festival Zunido, no Pompéia, que começa hoje e vai até dia 19. Nesta semana, não dá pra perder Maíra Freitas e Jazz das Minas, o encontro de gigantes entre Marcos Valle e Azymuth amanhã e Kid Koala e Lealani no sábado e no domingo.
Agora voltando à nossa programação normal: sexta tem As Mercenárias no Bom Retiro, sexta e sábado tem Barão Vermelho no Belenzinho, Banda Mantiqueira convida Virgínia Rosa no Ipiranga e Russo Passapusso lançando o disco com Antonio Carlos & Jocafy no Pinheiros. Na sexta tem ainda Jenifer Souza no Belenzinho. No sábado e no Domingo Alice Caymmi, Felipe Catto e Ayrton Montarroyos levam o show Uma Noite Para Maysa ao Vila Mariana. Já no domingo tem MC Soffia no Ipiranga.
Vou fechar a caixinha de joias ao vivo com festas. Hoje no Secilians tem a Giro Afro Grooves, com dois DJs de Cabo Verde pela primeira vez aqui nesta serra: Mamba Demba e Micãh, além dos pais da Entrópica MZK e Ramiro Z.
Para ir sem freios, sábado é dia de ODD com Massimiliano Pagliara, Frontinn, Vermelho e Zopelar. Agora se você é jovem e não quer ir tão fundo, no Bar Alto tem Clubinho com Cashu, Omoloko e Fernando Moreno.
Domingo de tarde tem Pedras Preciosas na Balsa, com os DJs consoantes Mia B e Alex C e, no Miúda, onde estarei, rola a Mantra Diferente, só com som de vinil e os ilustres Dago Donato, Mancha Leonel, JP Cardoso, Pata Holger e Stela Campos nos pick-ups. Todo esse line-up luxuoso porque é aniversário da Tânia Oda e da Kátia Abreu.
Discos
Pagode Novo, Rodrigo Campos (YB Music)
Pagode Novo é um bom título porque Rodrigo vem inovando no samba desde a estreia. Eu fico louco com suas estruturas que sempre deixam espaços, com suas sequências de acordes abertas, sem uma resolução óbvia. Aqui tem ainda o tom coloquial que sempre permeia suas letras e uma celebração de muitos encontros entre amigos: Romulo Fróes, Juçara Marçal, Verônica Ferriani, Maria Beraldo. Um discaço que é novo como conceito, mas bom como o velho pagode, aquele do Cacique de Ramos
Tanto, Tagua Tagua (Wonderwheel Recordings)
O segundo álbum do produtor Felipe Puperi como Tagua Tagua vai fundo num romantismo com sabor contemporâneo. As dez canções sobre se apaixonar ou estar apaixonado trazem da soul music aquela atmosfera acolhedora e ao mesmo tempo pulsante, mas talvez por ter sido gravado em parte em São Francisco Xavier, também existe um quê de psicodelia rural nessa receita.
Raven, Kelela (Warp Records)
Ando meio fascinado por essa nova leva de cantoras que modernizam o soul/r&b. E esse segundo disco da norte-americana vai um pouco além dos gêneros. Não à toa sai pela Warp. Aqui tudo é um jogo entre tensão e alívio, que é típico do soul, mas os picos e os vales são muito pronunciados, indo da eletrônica à ambient music. Fora que as letras também me intrigam, por me transportarem para um universo muito diferente do meu: a realidade de uma mulher negra queer nos Estados Unidos.
Sem Calor Nem Dor, G. Paim (Meia Vida)
Uma das atrações do Rotunda que falei lá em cima é o lançamento desse disco. Aqui o esqueleto é pós-punk, tem aquela vibe anos 80 de guitarras fraturadas, beats meio electro, cheios de espaços e tensão, isso sem falar da gravação que traz um sujeira bem DIY. Gosto especialmente das letras com uma poesia melancólica mas nada complacente.
Livros
Escrever É Muito Perigoso, Olga Tokarczuk (Todavia)
Muito bom ver circular mais textos da polonesa depois que ela venceu o Nobel de literatura. Aqui a Todavia edita 12 ensaios que falam das suas inquietações com a cultura contemporânea mas também abrem espaço para discutir seu próprio processo criativo.
Quando As Especies se Encontram, Donna Haraway (Ubu)
Esse livro está entre as indicações que fiz neste mês na ocupação que faço na newsletter da Ubu. Aqui a filósofa e bióloga instiga uma reflexão sobre o que é ser humano hoje. Mais do que isso: o que é ser humano em relação a outros seres e organismos não-humanos, de bactérias a cães, de máquinas a ferramentas.
Filmes
Coração de Neon, Lucas Estevan Soares (cinemas)
Filme brasileiro que estreou em Cannes, Coração de Neon conquista pela narrativa. Sem dar spoiler, o filme se passa no bairro curitibano do Boqueirão em que pai e filho tem um serviço de telemensagens de amor ancorado em um velho Corcel tunado. Mas os sonhos de pai e filho se transformam radicalmente ao encontrar um lado menos romântico do amor.
Quando Falta o Ar, Ana e Helena Petta (cinemas)
Vencedor da edição do ano passado do festival É Tudo Verdade, o documentário registra a luta de mulheres na linha de frente di SUS durante o combate à pandemia de Covid-19 e o pandemônio promovido pelo governo Bolsonaro. Por meio dessas histórias, revela muito das desigualdades brasileiras.
Séries
Rain Dogs (HBO Max)
Ninguém faz comédia como os britânicos, justamente por que o drama é sempre um tempero proeminente. O que se destaca nessa nova série em que uma mãe solteira atolada pelas dificuldades financeiras tenta dar uma vida melhor para sua filha é o tom ácido do humor. Por enquanto só tem o primeiro episódio disponível.
Sex/Life (Netflix)
Não vou dizer que é a melhor série do mundo, mas tem alguma coisa nessa história que me atrai, acho que é coisa de quem cresceu vendo calcinha laranja na Sala Especial. Bom, para quem não viu a primeira temporada, a protagonista é uma mulher entediada no casamento que busca alternativas com um ex em Nova York. Esta segunda temporada se passa no Canadá, e as opções do cardápio sexual se expandem um pouco.